Coronavírus ameaça aumentar fome no mundo, que já afeta 135 milhões
O novo coronavírus pode agravar neste ano a situação das populações em situação de extrema fome, depois que no último ano o número de pessoas no mundo que sofriam dessa condição já havia aumentado, segundo um relatório conjunto publicado na terça-feira (21).
Cerca de 135 milhões de pessoas em 55 países passaram pela situação de insegurança alimentar em 2019, de acordo com o relatório sobre crise alimentar divulgado pela União Europeia (UE), a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) e o Programa Mundial de Alimentos (PAM).
Esse é o número mais alto registrado nos quatro anos de existência do relatório.
O aumento da insegurança alimentar ocorre por causa do aumento nos conflitos armados, principalmente na República Democrática do Congo e no Sudão do Sul, além do aumento da seca e das crises econômicas em Venezuela, Haiti, Paquistão e Zimbábue.
O acréscimo de 22 milhões de pessoas no relatório deste ano em relação ao passado se dá pela inclusão de novos países na lista.
Se a comparação for limitada aos 50 países apresentados no relatório deste ano e do ano passado, o número de pessoas em crise alimentar subiu em 11 milhões de pessoas, com um total de 123 milhões de pessoas nessas condições.
E a situação pode piorar com a nova pandemia de coronavírus, alertam os autores do relatório, especialmente nos 55 países mais vulneráveis.
Segundo os autores do relatório, eles “têm pouca ou nenhuma capacidade para lidar com os problemas de saúde ou socioeconômicos” relacionados à pandemia.
Além disso, o documento alerta que a COVID-19 poderia aumentar os níveis extremos de insegurança alimentar em países que dependem da importação de alimentos, turismo e exportação do petróleo em um momento em que esta commodity sofre uma queda histórica.
De acordo com uma projeção do Programa Mundial de Alimentos (PAM), 265 milhões de pessoas poderiam sofrer fome em 2020. Isso seria quase duas vezes mais que em 2019, devido ao impacto econômico da pandemia.
“As pessoas que precisavam de ajuda precisarão dela por ainda mais tempo e novas pessoas vão sofrer de insegurança alimentar por causa da COVID-19”, disse à AFP Arif Husain, economista do PAM e co-autor do relatório, para quem o novo coronavírus “não pode ter chegado em pior hora”.
– 9,3 milhões na Venezuela –
Pelo segundo ano consecutivo, três países atingidos por conflitos – Iêmen (15,9 milhões de pessoas afetadas), República Democrática do Congo (15,6) e Afeganistão (11,3) – registraram os piores resultados em todo o mundo.
“Os conflitos continuam sendo a principal causa das crises alimentares em 2019, mas os extremos nas condições climáticas e as crises econômicas são cada vez mais importantes”, diz o relatório.
A Venezuela, que passa por uma grave crise econômica e política, ocupa o quarto lugar. O país tem 9,3 milhões de pessoas em situação de grave insegurança alimentar aguda e necessidades de assistência urgentes.
Além disso, continua o informe, 1,2 milhão de migrantes venezuelanos sofreram em 20129 insegurança alimentar aguda em Colômia e Equador, dois dos principais destinos dos venezuelanos que fogem da escassez severa de alimentos e da hiperinflação que reduziu drasticamente o poder aquisitivo do seu país.
No ano passado, a Venezuela não constava desse informe porque não havia cifras confiáveis.
– Mudanças climáticas –
Os autores do informe advertem para o impacto das mudanças climáticas em vários países.
Em 2019, 4,4 milhões de pessoas enfrentaram crises alimentares no chamado corredor seco da América Central, integrado por El Salvador, Guatemala, Honduras e Nicarágua.
A insegurança alimentar nesta região, uma das mais suscetíveis a mudanças climáticas no mundo, deveu-se sobretudo à seca, que afetou os cultivos de milho e feijão, os pequenos agricultores e os trabalhadores agrícolas que ainda não se recuperaram plenamente da seca de 2018.
“Dado que se prevê que as mudanças climáticas aumentam a intensidade dos fenômenos meteorológicos extremos, países do Caribe enfrentam desafios formidáveis para proteger as pessoas, os meios de subsistência e as infraestruturas e para manter suas conquistas econômicas, sociais e ambientais”, alertam os autores do informe.
Os ministros da Agricultura do grupo dos 20 países mais industrializados (G20) publicaram nesta terça uma declaração na qual se comprometeram a garantir um aprovisionamento “suficiente” de alimentos para o mundo, “em quantidade suficiente e a preços razoáveis”.
Foto: Homem cozinha em uma rua do bairro Nigéria, na seção Isla Trinitaria de Guayaquil, Equador, em 11 de abril de 2020.
AFP / Jose Sanchez LINDAO