Oktober é capital social e orgulho de ser

Oktober é capital social e orgulho de ser

A Oktoberfest foi uma bela sacada do ex-prefeito Dalto dos Reis, ao se reunir com os clubes de Caça & Tiro e levantar a autoestima blumenauense, depois daquela maldita enchente de 1984. Ao longo das décadas, resultou na maior festa da cerveja do continente, o que é bom pra sede, pra alma e pro comércio. Não obstante, revela o capital social que constituiu o etos catarinense desde meados do século XIX. Esse fator antropolítico gerou efeitos no desenvolvimento e constitui parte essencial da identidade catarinense.

Em uma entrevista sobre desenvolvimento, na Folha de São Paulo, em 2015, o físico chileno Cesar Hidalgo disse, entre outras coisas, o seguinte: “Se Você quiser fazer uma coisa muito difícil, tente na China, se não der, no Japão. Mas se parecer impossível, tente na Alemanha. Se não der certo lá, desista”. O sentido dessa afirmação está em reconhecer a capacidade de cooperação e a obstinação como motriz do desenvolvimento. Se isso se limitasse às circunscrições do Brasil, se aplicaria à Santa Catarina e a Oktober é um exemplo disso.

      Hidalgo é professor do MIT – MassachussetsInstitutof Technology – e autor do livro “Why information grows”. Tentando entender como as economias bem-sucedidas se desenvolvem, ele encontra a resposta na cultura e afirma que essa resposta é o capital social.  Ele explica que certas sociedades têm maior capacidade de reunir pessoas com habilidades distintas e faze-las cooperar a fim de empreender grandes feitos. Não seria somente uma questão de instrução, mas de capital social: cultura de cooperação, associação, confiança, diálogo e amor ao lugar.

       Nessa direção, o físico chileno explica que uma coisa é ter 500 pessoas inteligentes e habilidosas fazendo, cada uma, suas próprias coisas e, à sua maneira, cuidando de suas vidas.  Outra é reunir 500 pessoas com conhecimentos diferenciados e provoca-las a construir um carro. Isso lembra aquela pergunta anedótica de como se enfiam 500 cabeças-duras num Fusca. Não é só uma questão de instrução, mas de cooperação e obstinação. Se houver algum jeito, habilidades específicas, cooperação e obstinação garantirão o feito. 

       Toda paróquia tem sua festa de Igreja e depende das pessoas mais cooperativas e obstinadas, satisfeitas em trabalhar pelo benefício comunitário. Todos têm algum conhecimento específico, desde a liderança do pároco, passando pela arrumação, pelos enfeites, comida, bebida, limpeza, a música, os quitutes, o bingo, até o tesoureiro. Agora “pense” numa festa da cerveja, que depende de milhares de pessoas e traz gente do Brasilzão todo e de outros países. Pensa na trabalheira pra deixar tudo limpinho e enfeitadinho! Pensa na “organizaçón”, Tu!

       Originalmente causa do desenvolvimento, esse capital social produz a necessária divisão do trabalho que um dos fundadores da Sociologia, o francês Emile Durkheim, identificou na evolução das sociedades. Aliás, o eminente sociólogo chamou isso de solidariedade, aquilo que, ao mesmo tempo, sustenta e justifica o valioso senso comunitário e republicano. Disso é gerado o etos de cada Comunidade, a identidade coletiva, o espirito da reconstrução, combustíveis da prosperidade. Sofisticado produto de fundo antropolítico, é isso que a Oktober é, na sua profundeza histórica e cultural.

Esse é o maior patrimônio inerente à Oktober, isto é, a cultura de pegar junto e manter o prumo. Daí que a Festa resgatou o orgulho de ser, sem o qual, dizia um velho filósofo, não há o que fazer. Quando surgiu, naquele fatídico 1984, era pra levantar a autoestima depois da lama e de humilhação da Natureza sobre a presunção humana. Blumenau e o Vale do Itajaí recuperaram esse orgulho num momento decisivo, daqueles em que o camarada decide se a vida acabou ou se vai em frente. Sempre em frente foi a decisão!

São os traços do Vale e de Santa Catarina: braço, cooperação e obstinação. Foi aquela maldita e abençoada enchente que mexeu com o orgulho e trouxe o capital social à tona. Não só anjos altruístas, mas também egoístas “mordidos” sabem cooperar e reerguer suas cidades, fazendo juntos o que ninguém faz sozinho.  Se Darwin, o grande amigo de Fritz Muller, fosse lido corretamente, esse tipo de lição estaria nos livros escolares: são a vontade e a cooperação que explicam a evolução humana e também sua melhor invenção: a bomba do chopp. O resto é espuma.

E quando a coisa dá certo e a tristeza foi enterrada, vem o tal do orgulho, que é quando o cara olha pra isso tudo e se reconhece na Festa. Não é uma Festa a ele oferecida. É uma festa cujo motivo, empenho e resultado também são dele. E, indo às profundezas, faz o indivíduoreconhecer o valor da cultura e da história da sua Comunidade. E não interessa se o teu sobrenome é Peters, Pedrini, Pedroso ou Petroski. O que interessa é o orgulho da Comunidade que reproduz o capital social do qual fazes parte e do qual a Oktober é um belo produto.

Dr. Walter Marcos Knaesel Birkner – Sociólogo

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